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Crítica | Kong: Ilha da Caveira


O termo “filme de monstro” habitua ir além, se tornando um verdadeiro gênero de espetáculo visual. E é por isso que para este tipo de filme funcionar, é essencial que seja um filme sobre o monstro. Dito isso, diferente de obras como Godzilla (2014) – que mais buscava entreter com aprofundamentos rasos em personagens igualmente rasos, o entretenimento de Kong reside no potencial destrutivo de seu protagonista, que desta vez, se torna eficiente em complexar sua humanidade e justificar seu antagonismo - igualmente complexo.

Estrelado por Tom Hiddleston, Brie Larson, Samuel L. Jackson, John Goodman, John C. Reilly e Toby Kebbell, Kong: A Ilha da Caveira conta a expedição de um time de exploradores e soldados que viajam para uma ilha desconhecida no Pacífico dominada por monstros, incluindo o mitológico Kong.

A direção do inexperiente Jordan Vogt-Roberts é surpreendente em diversos momentos visuais do filme. Estilosa ao ostentar a escala absurda de seu monstro em planos interessantíssimos de contraponto com seus rivais. Note como o diretor explora o ponto de vista dos humanos ao serem encarados por Kong em termos de escala, principalmente sob o olhar do personagem de Jackson, que revela seu orgulho em forma de fúria ao refletir fogo em seus olhos. Um momento parecido ocorre antes, quando o reflexo do fogo brilha nos óculos de um soldado, sorrindo enquanto joga bombas na ilha. É curioso como Vogt-Roberts utiliza deste mesmo artifício para dois pontos tão distintos na trama.

Inclusive, um dos pontos mais interessantes de Kong reside na humanidade de seus personagens, principalmente ao abordar sua ausência nos humanos. Se o filme acerta ao propor reflexões sobre a hostilidade humana nos inserindo em pontos de vista distintos – os personagens cativam no início para disfarçar que sua maior falha foi invadir um território que não os pertencia -, Vogt-Roberts não atinge o mesmo sucesso no processo de humanização dos mesmos (ou alguns dos mesmos). Os momentos que apresentam o entendimento de culpa do homem pela destruição da natureza soam convenientes demais para toda a urgência proposta desde o primeiro ataque de Kong (brilhantemente executado, diga-se de passagem). Há um momento entre os personagens de Hiddleston e Larson numa colina com o gorila que destoa do desespero apresentado pela devastação anterior. É fácil e conveniente. Por outro lado, gosto como a típica relação de Kong com a figura feminina é estabelecida. Há uma justificativa consciente e de acordo com a complexidade do gorila para não enxergar Larson como enxerga Jackson, por exemplo. É um momento típico de roteiro, desenvolvido de forma sutil e cuidadosa para escapar do clichê da relação de King Kong e a humana.

Outro acerto é a consistência no tom do filme, nunca caindo em armadilhas de senso cômico para aliviar a urgência da situação, ao mesmo tempo que não se leva tão a sério a ponto de ofuscar a trama central com Kong. Se John C. Rilley (perfeito no papel) estabiliza um justificável alívio cômico em momentos elegantemente apropriados – por mais que suas tiradas se tornem surreais, seu personagem não faz piadas inconvenientes em momentos extremamente tensos -, Vogt-Roberts trata a morte com uma urgência necessária. Qualquer um pode morrer, e se isso acontecer, não há o que possa ser feito. Não há espaço para cerimônias, só para sobreviver.

Parecido com Independence Day (1996) em sua estrutura narrativa, o diretor sabe explorar seu elenco expansivo, ainda que não busque se aprofundar tanto em suas figuras centrais. Neste caso, o desenvolvimento de personagem se torna contido e é explorado através do elo entre eles – preste atenção no nome Billy, por exemplo. Outra semelhança é explorar certos clichês de ação de forma bem-humorada. Não que seja para tirar risadas do público, mas tais artifícios são utilizados deixando claro a ciência de sua natureza, como o modo dramático em que Brie Larson dispara o sinalizador em certo momento, ou o sacrifício humano, quase banalizado, mas ainda ciente de seu absurdo em um quadro heroico.

Há mais conveniências incômodas no roteiro, como não notarem a aproximação de Kong em certos momentos, percebendo sua presença apenas quando já estava lá; ou a forma como Hiddleston encontra a tag de um dos soldados, chega a ser cinicamente absurdo, desta vez. Entretanto, estes momentos falhos não tiram o brilho da parte técnica do filme. Se o CGI de Kong é realista e expressivo, alcançando a perfeição, a fotografia de Larry Fong (Watchmen, 300, Batman vs. Superman) casa com a construção de 1973, estabelecida em tons vastamente aquecidos e empoados, semelhante a obras de guerra como Platoon (1986) e Além da Linha Vermelha (1998). A escolha por uma trilha sonora muitas vezes diegética também revigora um tom único à Kong, de Iggy Pop a Black Sabath, há momentos que lembram até mesmo Forrest Gump musicalmente.

Kong é um filme de entretenimento garantido para fãs do gênero, mas não se torna essencial, ainda que se destaque em alguns elementos de catástrofe e ação.

NOTA: 3,5/5

HOLANDÊSVOADOR

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